Madonna é tão conhecida quanto uma garrafa de Coca-Cola. No mês passado, um dos mais importantes diários da França – o Libération – dedicou nada menos que oito páginas para Madonna, no dia em que ela chegou a Paris. O jornal teve a coragem de publicar, na capa, apenas a foto de uma metade de seu rosto e o logotipo do Libé. Nem sequer colocou o nome de uma das maiores estrelas da música pop. Não precisou. Apesar de mudar o look a cada temporada, Louise Veronica Ciccone, a Madonna, é conhecida praticamente em todo o planeta. Os cubanos, por exemplo, são loucos por ela. Os chineses, nem se fala. Até em Teerã, seguramente, deve ter algum dissidente do aiatolá Khomeini, doido com a mulher.
Foi assim que comecei o texto da matéria de capa do Caderno 2, recém-lançado pelo Estadão, datado de 11 de outubro de 1987. O texto tinha sido datilografado em laudas, numa Remington. O que eu não poderia imaginar é que, quase 37 anos depois, eu estaria aqui num computador, digitando um texto para o site da CartaCapital, ainda falando da mesma estrela pop.
Naquele 1987, cantoras, cantores, bandas, nasciam e morriam num piscar de olhos. Mas com Madonna foi diferente. Aquela frase do Andy Wahrol foi por água abaixo.
Madonna provoca um fuzuê nesse Brasil de 2024, fuzuê muito provocado pela TV Globo, que transmite o show, verdade seja dita.
Acredito que em nenhum país do mundo um telejornal entraria ao vivo, às quatro horas da manhã, da porta do hotel onde está hospedada a estrela, para dizer que a uma hora dessas certamente ela estava dormindo.
Não, nenhum país do mundo faria isso.
O Brasil faz. O Brasil tupiniquim está mostrando, a cada meia hora, o povo na porta do hotel, cantando suas músicas, vestido como ela, contando história do tipo tem cinco noites que eu não durmo.
Suas músicas são cantadas fora do tom, sem melodia, num inglês ruim. Mas não faz mal.
Deixamos de lado a guerra na Ucrânia, o massacre dos palestinos, o empresário do Porsche, o morto no banco Itaú, a reforma tributária, a cara feia do Lira, os estudantes americanos, a imagem do assalto na esquina, deixamos tudo de lado.
Madonna só está competindo com o maior dilúvio visto na história do Rio Grande do Sul.
Eu termino a matéria de capa dizendo: Logo no início da carreira, a imprensa foi unânime em afirmar que Madonna não passava de um furacão. A revista Rolling Stone, por exemplo, na primeira reportagem sobre ela, foi taxativa: Não passa de uma oportunista.
O mundo é um grande erramos.
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.