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    Uma reitora fora da caixa – Educação – CartaCapital

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    A chegada da professora e pesquisadora Márcia Barbosa à reitoria da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) simbolizou a retomada da democracia na instituição, após a gestão de um interventor nomeado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. Seis meses depois de vencer as eleições e ser nomeada pelo presidente Lula, a segunda mulher a comandar a universidade em quase um século de história busca ampliar a diversidade no ambiente acadêmico e fortalecer o diálogo com a sociedade, com atenção especial às pautas socioambientais, de gênero e inclusão.

    “Não sou um perfil tradicional de cientista, nem de reitora. Sou uma física teórica que usa minissaia, batom, fala alto e é respeitada internacionalmente. Nada é mais disruptivo do que uma mulher livre”, afirma.

    Nesta entrevista a CartaCapital, concedida às vésperas de uma viagem a Brasília para reuniões com parlamentares e membros do governo, Márcia falou ainda sobre autonomia universitária, desinformação sobre o ensino público e as ambições de sua gestão.

    Confira, a seguir, os destaques da entrevista.

    CartaCapital: Antes da sua posse, a reitoria foi ocupada por um nomeado que havia perdido a eleição. Sua nomeação representou a retomada da democracia na UFRGS?

    Márcia Barbosa: O reitor anterior ficou em terceiro lugar na lista tríplice, com votação pífia, e assumiu como interventor. Adotou uma postura de pouco diálogo, cercando a reitoria com grades e alinhando-se ao governo Bolsonaro. Em 2023, enquanto atuava como secretária no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, percebi que a UFRGS passaria por uma transição complexa. Vencemos a eleição de 2024, realizada sob modelo paritário aprovado pelo Conselho, derrotando um grupo ligado a uma oligarquia que sustenta a ideia de que apenas professores mandam na universidade. A homologação da vitória ainda enfrentou contestação judicial, questionando o critério da paridade.

    CC: A senhora defende a paridade entre servidores, docentes e estudantes na eleição para reitorias. E sobre a autonomia universitária?

    MB: As universidades devem ter liberdade para definir seus processos eleitorais. A lista tríplice precisa ser revista pelo Congresso ainda neste governo. Quando um nome que não foi eleito é escolhido, instala-se um clima de desconfiança e deslegitimação. A universidade deve operar pela democracia, porque assim é mais eficiente. Este não é um assunto menor. Os institutos federais têm essa autonomia. Não há justificativa para manter o modelo da lista.

    CC: Como encontrou a administração e quais são as principais metas da sua gestão?

    MB: Ampliamos o diálogo e fizemos um levantamento do que não estava andando. A dívida em infraestrutura supera o orçamento atual, por isso buscamos mais recursos, sobretudo com os parlamentares. Já reformamos o restaurante universitário central e há melhorias em andamento em outras unidades e nas casas de estudantes. Nosso plano diretor prioriza ações afirmativas e iniciativas voltadas à emergência climática.

    CC: A senhora é apenas a segunda reitora da história da UFRGS. Quais estratégias têm sido adotadas para ampliar a presença feminina em cargos de liderança?

    MB: A UFRGS é referência nacional nesse tema. Metade das direções e pró-reitorias está sob liderança feminina. Atuo nessa pauta há 25 anos, numa área em que eu era a única mulher na sala. Hoje, nossos concursos valorizam a maternidade – uma mulher ter filho conta ponto para a banca. E bancas exclusivamente masculinas precisam justificar sua composição. Temos essa preocupação como universidade, o que não significa que tenhamos um ambiente acadêmico livre do machismo.

    CC: Essa preocupação inspirou a criação da Pró-Reitoria de Ações Afirmativas e Equidade?

    MB: A universidade pode ser um ambiente hostil. Em 2016, realizei uma pesquisa sobre assédio na UFRGS: 50% já haviam sofrido assédio moral e 10%, sexual — sobretudo mulheres, pessoas negras e LGBTs. O acolhimento é fundamental. Quando usei a palavra “todes” num vídeo de recepção, recebi uma onda de ódio, mesmo sendo um gesto simbólico de inclusão. Em março, o pesquisador Flavio Kapczinski iniciou um estudo nacional sobre saúde mental entre jovens acadêmicos. O que for descoberto será implementado, pois nossa gestão é baseada em evidências.

    CC: Segundo o IBGE, 25,4% das pessoas com mais de 25 anos têm ensino superior. Como as instituições estão lidando com a ampliação do acesso e qual o impacto da Lei de Cotas?

    MB: As universidades públicas são responsáveis por cerca de 30% das formações — o restante vem do setor privado, incluindo muitas universidades fast food, com cursos online, gravados e sem professores. As cotas trouxeram para dentro da universidade públicos historicamente excluídos, o que tem provocado mudanças – em algumas áreas mais do que em outras. Em cursos das ciências sociais, por exemplo, estudantes negros e quilombolas exigem representatividade na bibliografia. Isso está transformando as dinâmicas acadêmicas.

    CC: Ainda há muita desinformação sobre as universidades públicas?

    MB: Sim. Muitos jovens não acreditam que a universidade possa fazer parte do seu futuro. Os cursos exigem esforço e dedicação, mas esse processo fortalece a capacidade de resolver problemas complexos. Precisamos comunicar melhor esse valor para combater ataques financiados que tentam descredibilizar a academia com fake news e teorias conspiratórias. De que a academia é ruim, é um antro de comunistas…

    CC: O Rio Grande do Sul foi duramente atingido por catástrofes socioambientais, como as cheias de maio de 2023. Como a UFRGS tem se envolvido com esse tema?

    MB: Durante a crise, reunimos pesquisadores e produzimos diagnósticos entregues às autoridades. Estamos criando uma secretaria de emergência climática e propusemos a criação do primeiro centro de gestão ambiental da região, com sensores oceânicos. Queremos também capacitar professores da rede básica para tratar do tema em sala de aula. Em maio, realizaremos um grande evento com presença internacional e da ministra Marina Silva.

    CC: Uma aluna da UFRGS foi premiada como promessa mundial da neurociência. Como ampliar o financiamento à ciência?

    MB: Queremos ampliar as bolsas, essenciais para evitar evasão. Todo pesquisador precisa de apoio. Também é necessário fomentar projetos de risco e investir em áreas estratégicas, como neurociência e transição energética. Uma das nossas propostas é a criação de uma Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial.

    CC: Recentemente, um aluno tentou se formar com uma suástica pintada no rosto. O que foi feito? E o que isso revela sobre a formação ética?

    MB: O vice-reitor acionou a Polícia Federal, como faria com qualquer pessoa que entrasse com uma suástica na universidade. Foi criada uma comissão para investigar se outras medidas cabem, embora o aluno não esteja mais vinculado à UFRGS. Formamos profissionais com domínio técnico — inclusive os que criam deep fakes e espalham desinformação. Se isso está acontecendo, estamos falhando. Especialmente os cursos de exatas precisam repensar seu currículo ético.

    CC: No fim de 2024, a UFRGS instalou uma Comissão da Memória e Verdade. Qual a importância da iniciativa?

    MB: O objetivo é resgatar os nomes de pessoas perseguidas e expulsas da universidade durante a ditadura militar, oferecendo um alento às famílias. Sou da geração que foi às ruas pelas Diretas Já. Vivi um tempo em que não se podia falar livremente. Trabalhar para nada ficar encoberto é um compromisso com o futuro.

    Informações são do site Carta Capital, Clique aqui

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