“Por que será que os jovens estão nascendo cada dia mais velhos?” – Vinicius de Moraes
No 75º aniversário da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), comemorado na semana passada, o secretário-geral da Organização, Jens Stoltenberg, informou que a maioria dos membros daquela aliança militar alocará ao orçamento militar 2% do Produto Interno Bruto (PIB) dos respectivos países.
Segundo ele, até o ano passado, apenas três países o faziam.
O mundo se aproxima, dessa forma, ainda mais rapidamente do trágico final.
Os jovens sequer terão o direito de envelhecer, como ocorre atualmente na Ucrânia, em que o alistamento obrigatório reduziu, há poucos dias, a idade mínima de 27 para 25 anos.
Vale notar que os principais países daquela famigerada Organização estão literalmente falidos, devendo mais de 100% de seus PIBs: Estados Unidos da América, Reino Unido, França e Itália (deve 140%), dentre outros.
Drenar esse volume de recursos para gastos que não constituem investimentos, que não trazem retorno econômico, apenas os empobrecerá, aumentando ainda mais o número de empobrecidos, a violência interna – inclusive pela maior circulação de armas – e a redução de serviços públicos, entre os quais educação, saúde, habitação e saneamento.
As exceções serão os EUA, o maior exportador de armamentos (40%), e a França (11%), mas gerando internamente maior concentração de renda e riqueza, quando já se chegou a um paroxismo, que secou as classes médias, com poder de compra cada vez mais reduzido.
Vale lembrar que esse é o caldo de cultura que a extrema-direita mais aprecia, em que pulula como berne em toucinho, como pinto no lixo.
Bem-vindos de volta ao século XX!
Apenas algumas placas de identificação foram trocadas na mudança cronológica de século: os nazistas agora são a extrema-direita israelense, que massacra com fúria hitlerista os palestinos em Gaza e na Cisjordânia, além de bombardear e assassinar no sul do Líbano, na Síria e onde lhe seja conveniente, sem qualquer sanção internacional.
Com efeito, assistimos ao fracasso da diplomacia, como profissão e prática.
Quando as armas assumem o protagonismo internacional, a diplomacia esmaece em direta e igual proporção.
Entretanto, no Brasil não presenciamos aquela reflexão.
Talvez porque a diplomacia, na América Latina, em geral, com exceção do México, esteja sempre submissa aos militares.
O caso do Brasil é simbólico: os diplomatas que se rebelaram ao golpe de 64 foram cassados pelos militares. O embaixador José Jobim foi por eles assassinado, na iminência de denunciar a imensa corrupção da caserna (a qual, porém, no golpe de 2016, como nos anteriores, se propagandeava ilibada…).
Pior, na Terra de Santa Cruz a diplomacia nem se atreve ao cumprimento da Constituição, que, em seu artigo 4o, parágrafo único, determina que a política externa da República promova a integração latino-americana.
Vejamos o saldo atual daquele preceito constitucional: a) temos o Haiti em total e absoluta falencia, com aeroportos e portos fechados, e 53 mil pessoas tendo de abandonar suas casas na capital, em busca de abrigo no interior, fugindo do terror das milícias urbanas; b) assistimos à invasão armada de território mexicano (a embaixada tem extraterritorialidade garantida pelo direito internacional público) por parte de forças policiais do Equador e a consequente ruptura de relações diplomáticas entre ambos os países; c) nos pronunciamos sobre a situação interna da Venezuela, prática condenada pela Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, da qual fazemos parte.
Se nosso objetivo, determinado pela Carta Magna, era a integração continental, não aparentamos estar próximos, tomando por base os três tópicos acima citados: a) o que fez o Brasil para restabelecer a ordem no Haiti, martirizada nação caribenha? Que se saiba, apenas se dispôs a integrar a força policial multinacional que seria enviada ao país, sob a liderança do Quênia (sim, a África tem, atualmente, a diplomacia mais dinâmica do planeta); b) no episódio da agressão equatoriana, soltamos uma nota que fala em “precedente perigoso”, o que seria cômico, se não fosse trágico, algo como receitar aspirina para alguém que sofre de câncer; sequer fizemos um movimento de cena, como convocar o embaixador do Equador e apresentar nosso protesto, ao mesmo tempo em que se convocaria o embaixador do Brasil em Quito, para consultas, como foi feito no caso de Israel; c) ao nos pronunciarmos sobre a situação interna de um país, além da vedação antes referida da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, antes referida, conhecemos a realidade daquela nação para assim procedermos? Sabemos que o sistema eleitoral venezuelano é mais perfeito do que o nosso, pois os votos são, a um tempo, eletrônicos e impressos, em muito aperfeiçoando a auditoria deles? Em caso negativo, como nos diferenciamos dos tios do zap que se pronunciam sobre todo e qualquer assunto com escasso ou nenhum conhecimento, apenas baseados em informações manipuladas, inclusive pelas oito famílias donas da “grande imprensa” nacional?
Por fim, como o Brasil tentou mediar, diplomaticamente, cada uma dessas situações, tanto no âmbito bilateral quanto no multilateral? Desconheço.
Pior, a oligarquia gaúcha, uma das mais atrasadas do País (o que é dizer muito, tendo em vista as demais), haja vista o atraso socioeconômico do estado, apoiou Milei e sua ideologia de extrema-direita e agora amarga os resultados: retração de 17,2% nos embarques para a Argentina, apenas no primeiro bimestre, sendo que no setor de máquinas e equipamentos agrícolas esse número atinge 81,3% – um verdadeiro desastre para a imensamente combalida economia do RS, uma vez que se tratam de exportações com alto valor agregado, não simples commodities, que pouco ou nada contribuem para a reindustrialização do fazendão Brasil.
Ironicamente, quem salva as exportações do estado meridional é a China, comunista (rs), com importações cinco vezes mais volumosas.
O que faz a diplomacia para lidar com esse dado de estado fronteiriço? Como tentar compensar essas perdas que trarão ainda mais depressão econômica ao já tão combalido RS, o que menos cresce em toda a República? Não tem o Itamaraty uma Representação lá?
Na busca de inspiração, encontramos no Almanaque Brasilidades, de Luiz Antonio Simas, uma pérola da nossa genial Doutora Nise da Silveira: “Para navegar contra a corrente são necessárias condições raras: espírito de aventura, coragem, perseverança e paixão.”
Finalmente, sobre Elon Musk, verificamos que dinheiro não guarda nenhuma relação com inteligência.
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.